A trabalhadora pode contar com a proteção da legislação trabalhista neste momento de sua vida? A lei garante o direito à licença-maternidade e o direito à estabilidade. Contudo, em caso de aborto, para esse segundo direito, a situação fica indefinida, já que a lei não prevê tal situação. O aborto natural é aquele em que a gestação é interrompida de forma involuntária e, segundo especialistas, costuma atingir quase 20% das gestações no país.
A legislação brasileira protege as gestantes e o nascituro, em especial com à estabilidade no emprego, que se inicia com a gravidez e se encerra cinco meses após o parto. O outro direito consiste no afastamento por meio da licença-maternidade que, via de regra, é de 120 dias.
Segundo o artigo 395 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para os abortos involuntários ocorridos até a 23ª semana de gestação, a empregada possui direito a 14 dias de afastamento, mediante apresentação de atestado médico. A partir da 23ª semana, a empregada passará a ter direito à licença-maternidade de 120 dias.
Já com relação a estabilidade, entretanto, a legislação é omissa e há diferentes interpretações para o caso. A interpretação judicial mais comum é de que a trabalhadora que sofre aborto até a 22ª semana possui, sim, direito à estabilidade. O direito se estenderia, nesse caso, apenas até o 14º dia após a interrupção da gestação.
Por outro lado, em caso de aborto a partir de 23º semana, na prática, a trabalhadora não poderá ser dispensada no 15ª dia após o aborto, uma vez que a mesma estará afastada pelo prazo de 120 dias.
Em meio à insegurança jurídica, caso a trabalhadora tenha sido dispensada durante o período de estabilidade, deverá procurar um advogado de sua confiança e acionar o empregador perante à Justiça do Trabalho. Já com relação à licença-maternidade, inicialmente, deve procurar o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), providenciar toda a documentação necessária e buscar solucionar o problema pelo caminho administrativo em um primeiro momento. Caso não seja possível, deverá buscar um advogado, que ingressará na Justiça contra a Previdência Social.
A trabalhadora, na ação que exige o direito à estabilidade, deverá comprovar desde quando estava grávida e, por meio de relatórios e atestados médicos, a data do aborto.
Trata-se de um processo trabalhista comum e que pode ser resolvido de forma dita simples, sem a necessidade, por exemplo, de serem convocadas testemunhas. O tempo para a ação ser concluída costuma variar conforme a cidade em que o processo está correndo e de uma região para a outra. Via de regra, a Justiça do Trabalho costuma realizar acordos logo na primeira audiência e, nesse caso, podemos pensar em uma estimativa média de aproximadamente seis meses. O tempo máximo costuma ser de dois a três anos quando a ação perdura até o fim, com todos os seus recursos e fases.
Outro ponto importante consiste em como as alterações na legislação trabalhista com a Lei nº 13.467/17, aprovadas pelo Congresso Nacional há dois anos, poderia ter afetado as mulheres e interferido no número de abortos do país. Isto porque, com a Reforma Trabalhista, a gestante ficaria autorizada a trabalhar em ambientes insalubres. Entretanto, recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionalidade da norma e proibiu o trabalho insalubre para as gestantes.
Assim, podemos concluir que a legislação trabalhista traz hoje regras específicas para as trabalhadoras gestantes e, por conta de sua clareza, conferem certa proteção a elas no caso da licença-maternidade. Entretanto, em relação ao período de estabilidade, a lei é omissa e segue a cargo do Judiciário proteger a trabalhadora em caso de um aborto natural.
Daniel Moreno
https://www.dgabc.com.br/Noticia/3118059/direitos-da-trabalhadora-em-caso-de-aborto-natural